Data <\/span>21\/jan\/2005<\/span><\/span><\/td>\n<\/tr>\n<\/tbody>\n<\/table>\n
\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0Manh\u00e3 estabelecida. Desjejum. Higiene corporal cumprida. A for\u00e7a mec\u00e2nica do h\u00e1bito, ent\u00e3o, o fez ir, em seguida, saber da caixa de correspond\u00eancia incrustada ao muro, se j\u00e1 havia os jornais. \nEra s\u00e1bado. Dia em que o aprazava dedicar-se a leituras esparsas e acumuladas. As quais compunham-se de jornais, revista, alguns peri\u00f3dicos de cunho t\u00e9cnico-cient\u00edfico. \nA rotina se cumpria. Havia os jornais. Havia a revista semanal. Mas ainda, algo, ficara mesmo pasmo de surpresa, algo incomun\u00edssimo, de t\u00e3o antigo, de t\u00e3o raro, escasso, se n\u00e3o ainda completamente abolido. \nH\u00e1 tanto tempo desaparecera de sua conviv\u00eancia. Dele e de toda a gente. Perdera-se no esquecimento aquele utens\u00edlio. N\u00e3o mais soubera que quaisquer outras pessoas ainda o praticassem. Pertencia a um passado nem tanto remoto, todavia consumado. \nMais que o \u00edmpeto de logo conferir do que se tratava que tivesse levado ao recurso do que talvez fora o mais eficiente mecanismo de preserva\u00e7\u00e3o do sigilo, viu-se remetido subitamente aos quandos em que muito o praticara. \nDe escolar a jovem maduro. Com um ou outro amigo, poucos, mantivera uma certa freq\u00fc\u00eancia de contato por essa via. Todavia seu uso intenso fez-se mesmo em seu relacionamento amoroso. Nas aus\u00eancias sua e dela. Ou quando separados por desentendimentos quase sempre movidos a ci\u00fames. A carta impec\u00e1vel. Especial papel condizente. Belo envelope em sua moldura tra\u00e7ada em verde e amarelo. A carta com seu texto. A letra em seus tra\u00e7os caracterizadores; o l\u00e9xico portador de revela\u00e7\u00f5es, insinua\u00e7\u00f5es, declara\u00e7\u00f5es, desola\u00e7\u00f5es, s\u00faplicas expl\u00edcitas ou veladas. A sintaxe expressando um certo estado de \u00e2nimo; um certo estado de des\u00e2nimo; um certo estado euf\u00f3rico revestidos de poucas ou acentuadas reflex\u00f5es. \nTamb\u00e9m se entregara \u00e0 elabora\u00e7\u00e3o delas como um escriv\u00e3o de sua av\u00f3. N\u00e3o-alfabetizada, ela acumulava as cartas recebidas dos parentes pacientemente. Organizadamente. Embora n\u00e3o lesse, sabia de cada qual o portador. Vivia em fazenda. As f\u00e9rias levavam os netos para l\u00e1. Quando ent\u00e3o ele cumpria a tarefa de p\u00f4r em linguagem escrita as respostas dela. \nConsumiam duas, tr\u00eas noites nessa tarefa, que o ac\u00famulo de cartas aguardava. Era um ritual. Ela dizia, ele escrevia. Ela pedia para ouvir. Retificava v\u00e1rias vezes. Certas palavras. Certas coloca\u00e7\u00f5es. Tudo primeiro era rascunho. Escrevia e depois copiava cada carta. Ela guardava cada rascunho. Respondia que porque gostava de saber a quantidade de recebidas e respondidas. Havia tantas amarelecidas, enodoadas, quase apagadas. Caixas de camisa amontoavam-se sobre seu guarda-roupa armazenando-as. \nA av\u00f3 h\u00e1 muito se passou. A populariza\u00e7\u00e3o do telefone foi rarefazendo as cartas mais e mais. E a crescente e irrevers\u00edvel populariza\u00e7\u00e3o do correio eletr\u00f4nico institu\u00eddo pela internet, se, por um lado, impede a extin\u00e7\u00e3o por completo dessa antiga forma de correspond\u00eancia, por outro, descaracterizou-a quase inteiramente. \nFinda a reminisc\u00eancia, deteve a aten\u00e7\u00e3o no envelope tradicional subscrito \u00e0 m\u00e3o em tinta azul de esferogr\u00e1fica. \nO novo impacto deu-se ao ler que o remetente era o grande poeta do Pa\u00eds sobre o qual elaborara um trabalho. Na carta ele tecia elogios ao longo ensaio que o destinat\u00e1rio compusera sobre sua obra po\u00e9tica e que fora publicado. Dizia-se muito grato e lisonjeado. E aproveitava para apresentar suas discord\u00e2ncias com alguns pontos da an\u00e1lise. \nAo final, ap\u00f3s sua assinatura, em PS, escrevera o seu e-mail, \u201cpara eventuais correspond\u00eancias\u201d. \n<\/span><\/td>\n<\/tr>\n
Data 21\/jan\/2005 \u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0Manh\u00e3 estabelecida. Desjejum. Higiene corporal cumprida. A for\u00e7a mec\u00e2nica do h\u00e1bito, ent\u00e3o, o fez ir, em seguida, saber da caixa de correspond\u00eancia incrustada ao muro, se j\u00e1 havia os jornais. Era s\u00e1bado. Dia em que o aprazava dedicar-se a leituras esparsas e acumuladas. As quais compunham-se de jornais, revista, alguns peri\u00f3dicos de cunho […]<\/p>\n","protected":false},"author":2,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":[],"categories":[17],"tags":[4],"yoast_head":"\n