{"id":288,"date":"2004-04-12T00:48:23","date_gmt":"2004-04-12T00:48:23","guid":{"rendered":"http:\/\/poetagem.com.br\/?p=288"},"modified":"2016-09-24T00:48:55","modified_gmt":"2016-09-24T00:48:55","slug":"acaso","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/poetagem.com.br\/2004\/04\/12\/acaso\/","title":{"rendered":"Acaso"},"content":{"rendered":"\n\n\n
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Data 12\/abril\/2004<\/span><\/td>\n<\/tr>\n<\/tbody>\n<\/table>\n

\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0Pensou. O acaso talvez lhe desse a paz dos imposs\u00edveis. Tanto quisera ter feito. E o que fizera n\u00e3o s\u00f3 parecia pouco, como \u00ednfimo. Com se mal tivesse se movido de modo que muita vez entendesse \u00e0 exaust\u00e3o. Agir pacientemente uma pessoa daquele tanto e ao fim sequer compreender o quanto de dist\u00e2ncia ainda havia.
\nVerdadeiramente aquele pouco lhe parecera ent\u00e3o substancioso, que para nele aportar empenhara-se deveras. N\u00e3o se tratava de ter para si nada que figurasse em demasia; nada que ostentasse extravag\u00e2ncias, que pusesse em risco a falta, o desd\u00e9m. Tampouco situa\u00e7\u00f5es assemelhadas a desdouro e menosprezo.
\nO fato de tender a ser o quanto possa o bastante a si mesmo era uma op\u00e7\u00e3o de exist\u00eancia, n\u00e3o uma arrog\u00e2ncia perante aos demais, perante a vida, perante a Deus. Solid\u00e3o. Solil\u00f3quio. Situa\u00e7\u00e3o de um sujeito que preza muito ter-se a si mesmo, sem proje\u00e7\u00f5es, sem quaisquer neuroses avassaladoras. A presen\u00e7a de outrem da forma como as circunst\u00e2ncias e as naturalidades da vida delineassem. Presen\u00e7as. Bem ou malquistas, que n\u00e3o soubesse bem se portar ante uma ou outra, ou ante ambas concomitantes. Do que n\u00e3o abdicava era da condi\u00e7\u00e3o de se autodirecionar, conquanto isso j\u00e1 lhe tivesse acarretado dissabores n\u00e3o poucos. Mas considerava o conjunto de bem-aventuran\u00e7as confortador.
\nSim, o acaso \u00e9 um comboio portador de inesperados e desconhecidos. Cabe ao homem com ele interagir. Mir\u00e1-lo. Sopes\u00e1-lo. Admiti-lo. Recha\u00e7\u00e1-lo. Atos nada tranq\u00fcilos de se p\u00f4r em curso. O acaso quase sempre \u00e9 impositor, n\u00e3o oferece nem possibilita escolha, op\u00e7\u00e3o. Traz consigo a trilha a quem se destina. \u00c9 intruso. E sua irrup\u00e7\u00e3o nada tem a ver com as fatalidades prescritas ou impostas por a\u00e7\u00f5es ou medidas sobrenaturais. Irrompe como situa\u00e7\u00f5es, fatos, sentimentos derivados dos interst\u00edcios de a\u00e7\u00f5es pensadas, articuladas. Do conjunto de conseq\u00fc\u00eancias destas esper\u00e1veis, inesperadamente insurge o acaso. E sua for\u00e7a impositiva muita vez anula os obtidos resultados que se buscava e que se esperava.
\nTrava-se ent\u00e3o f\u00e9rrea porfia entre o que se queria que se fizesse e o que se quer fazer. Duro entrevero. Pois que entre a pretens\u00e3o e a gratuidade nada sobra de invalidade, de desapre\u00e7o.
\nNada \u00e9 por acaso, a sapiente e sentenciosa afirma\u00e7\u00e3o. Sim, tampouco o acaso \u00e9 por acaso, que, no entanto, \u00e9 certamente por imponderabilidade da natureza social humana.
\nGestar a vida sorvendo os amargores como efeito desses retemperos do imponder\u00e1vel. N\u00e3o que devesse ser um para\u00edso, pois que o pr\u00f3prio para\u00edso sofreu solertemente suas amarguras. E geri-las com o desprendimento dos que se v\u00eaem em seu oceano apenas munidos de seu barco e remo, os quais, para n\u00e3o so\u00e7obrar, dependem de sua competente maestria em pilotagem. Geri-la com a imprescind\u00edvel tarefa cab\u00edvel aos que com sua coragem confrontadora aos medos que a circundam, que a espreitam, que a rondam, que figuram permanente amea\u00e7a, caminham na consecu\u00e7\u00e3o do fatal fim da vida: constru\u00e7\u00e3o\/desconstru\u00e7\u00e3o; forma\u00e7\u00e3o\/transforma\u00e7\u00e3o. E assim o presente sendo o futuro n\u00e3o-constru\u00eddo, o futuro prestes a, n\u00e3o engendrado, instaurar sua autentica\u00e7\u00e3o consignando-se em presente brotado pelo acaso desarraigado de quaisquer presum\u00edveis previs\u00f5es.
\nA consci\u00eancia, que ao homem privilegia e superioriza, posto que pondere, que probabilize, tem como de suas mais caras ins\u00edgnias a improbabilidade, a imponderabilidade.
\nOs des\u00edgnios que o acaso engendra. Os quais sofismam n\u00edtidas apar\u00eancias de insaciedade, por mais inebriantes possam ser as contingentes sedu\u00e7\u00f5es. As sedu\u00e7\u00f5es do f\u00e1cil, do in\u00f3cuo. Que entumescem homens e homens de um cheio de nadas que se configuram em verdadeiro vazios. Que a esses mesmo homens, muitos, d\u00e3o a dimens\u00e3o e a contextura do inespesso, da indensidade. N\u00e3o por acaso.<\/span><\/td>\n<\/tr>\n

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