Data <\/span>13\/ago\/2004<\/span><\/span><\/td>\n<\/tr>\n<\/tbody>\n<\/table>\n
\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0A arte, o universo que o arrebata, o objeto de suas inventivas, invectivas. Algumas manifesta\u00e7\u00f5es dela, como a quem assim por ela se v\u00ea tomado, mais o atraem. Destas a menos sedutora da escala preferencial \u00e9 a pintura, que, todavia, aprecia como um amador semiestudioso e um colecionador de r\u00e9plicas, porque n\u00e3o-pertencente \u00e0 categoria dos abastados para a aquisi\u00e7\u00e3o dos originais, e porque radicalmente contr\u00e1rio \u00e0 exorbit\u00e2ncia inexplic\u00e1vel dos pre\u00e7os que lhe s\u00e3o atribu\u00eddos. Nada justifica isso. O trabalho artesanal; o tempo dedicado \u00e0 constru\u00e7\u00e3o; os custos da mat\u00e9ria e do material empregados; engenho e arte do artista. Nada. O pre\u00e7o \u00e9 um disparate, um desprop\u00f3sito que os ricos colecionadores sustentam. Cifras expressivas em muitos mil reais, em altos d\u00f3lares. \nEntretanto, tem o gosto de quadro exposto em suas paredes. Ent\u00e3o, pendura os seus Picasso, Monet, Degas, Tarsila do Amaral, Mondrian, Lasar Segal, Bosch, Brugel, Vel\u00e1squez, Kandinsky, Portinari, Mir\u00f3… \nO efeito po\u00e9tico das figuras estampadas pelos pap\u00e9is impressos n\u00e3o lhe parece ser diferente. A obra ao receptor \u00e9 o resultado que seu todo instaura ante a emo\u00e7\u00e3o est\u00e9tica despertada naquele. Os detalhes t\u00e9cnicos, organizacionais importam aos especialistas aos cr\u00edticos. Ent\u00e3o, conceber e avaliar o conjunto desde a inteireza das partes e assunto para eles. O apreciador comum pragm\u00e1tico gosta ou n\u00e3o considerando o todo que os seus sentidos captam. Portanto, um quadro em reprodu\u00e7\u00e3o pendurado na parede n\u00e3o causa menos sentimento de beleza e enlevo do que o original, com seus detalhes ressaltados, como o presum\u00edvel frescor e vivacidade de suas tintas com suas cores. \nMas suas paredes, aparadores, piano, c\u00f4modas, prateleiras se enfeitam n\u00e3o s\u00f3 com esses quadros pict\u00f3ricos. Intermedeiam-nos nas paredes, suprem-nos, nos m\u00f3veis, p\u00f4steres de fotografias v\u00e1rias. Talvez seja uma forma de imortalizar seus mortos e presentificar seus vivos. \nEnt\u00e3o, \u00e0 vista das perdas pouco espa\u00e7adas de seus estimados c\u00e3es, decidiu dedicar-lhes um espa\u00e7o. T\u00ea-los-ia tamb\u00e9m ali, em p\u00f4steres, rememorando dias, evocando epis\u00f3dios, amorosidades rec\u00edprocas. A fidelidade canina. A indefect\u00edvel perman\u00eancia a seu lado onde na casa estivesse. A vigil\u00e2ncia incans\u00e1vel. As alegrias familiares das brincadeiras. E os entristecimentos e cuidados quando das doen\u00e7as, tanto deles quanto dos da fam\u00edlia. As consterna\u00e7\u00f5es, quando fora a hora da morte. \nTratou de buscar nos \u00e1lbuns uma fotografia bem representativa de cada um. Encontrou uma Laika, adorada dobermann, em cujo pesco\u00e7o seu neto primog\u00eanito estava atarracado. Um Bolinha fuj\u00e3o, em que seu filho ca\u00e7ula, em plena inf\u00e2ncia, ajuda a m\u00e3e a lhe dar banho. Bidu, dulc\u00edssimo, setter cujas largas orelhas seu neto segundo parece quer esticar ainda mais. Zez\u00e3o, o puro pastor da fam\u00edlia paparicado, a seu p\u00e9 em postura majest\u00e1tica. \nPronta e posta, vigorava a galeria de p\u00f4steres dos idos c\u00e3es da casa. Faltava a de Esnupe, um querido b\u00f3xer. Os \u00e1lbuns n\u00e3o acusavam nenhuma. Sentia-se meio ingrato. Incomodado. Como fora poss\u00edvel escapar-lhe uma fotografia dele. \nSonhou um dia com Esnupe, de \u00f3culos, consultando na enciclop\u00e9dia Larousse o verbete Literatura. N\u00edtido e impressionante sonho. Esnupe desviava os olhos da enciclop\u00e9dia para ele, dele para ela. \nN\u00e3o resistiu. Foi \u00e0 enciclop\u00e9dia. Apanhou o volume devido. L\u00e1 estava marcando a se\u00e7\u00e3o Literatura uma fotografia em que Esnupe repousava em sua predileta poltrona.<\/span><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"
In memoriam Data 13\/ago\/2004 \u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0A arte, o universo que o arrebata, o objeto de suas inventivas, invectivas. Algumas manifesta\u00e7\u00f5es dela, como a quem assim por ela se v\u00ea tomado, mais o atraem. Destas a menos sedutora da escala preferencial \u00e9 a pintura, que, todavia, aprecia como um amador semiestudioso e um colecionador de r\u00e9plicas, porque […]<\/p>\n","protected":false},"author":2,"featured_media":0,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":[],"categories":[17],"tags":[90],"yoast_head":"\n
In memoriam - POETAGEM<\/title>\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\t\n\t\n\t\n