{"id":362,"date":"2004-12-30T01:41:55","date_gmt":"2004-12-30T01:41:55","guid":{"rendered":"http:\/\/poetagem.com.br\/?p=362"},"modified":"2016-09-24T01:42:27","modified_gmt":"2016-09-24T01:42:27","slug":"utopia","status":"publish","type":"post","link":"http:\/\/poetagem.com.br\/2004\/12\/30\/utopia\/","title":{"rendered":"Utopia"},"content":{"rendered":"<table border=\"0\" width=\"300\" cellspacing=\"0\" cellpadding=\"0\">\n<tbody>\n<tr>\n<td bgcolor=\"#660000\">\n<div align=\"center\"><span style=\"color: #fff7ee; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: small;\">Utopia<\/span><\/div>\n<\/td>\n<\/tr>\n<tr>\n<td><span style=\"color: #000000; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: small;\">Data <\/span><span style=\"font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: small;\"><span style=\"color: #000000;\">30\/dez\/2004<\/span><\/span><\/td>\n<\/tr>\n<\/tbody>\n<\/table>\n<p><span style=\"color: #000000; font-family: Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: small;\">\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0Deixarem-se ficar ali por conta da hora \u00e0-toa. Hora sem tempo marcado. Hora para puro prazer de estar se sentindo pleno de t\u00e3o vazio de tudo que n\u00e3o seja aquele absoluto instante.<br \/>\nAlentavam isso como das mais caras das utopias imediatas que habitam o cotidiano de gente viva, atuante, trabalhadora, sobrecarregada de afazeres, compromissos, prazos, hor\u00e1rios.<br \/>\nS\u00e1bado, domingo, suspensos os prazos e compromissos, tr\u00e9gua que a m\u00e1quina cotidiana reprodutora da vida submetida a mais valia concede aos seus s\u00faditos. Ent\u00e3o, as utopias ressurgem, renovam-se, reaviavam os \u00e2nimos. E retocadas tornam ao cabide da esperan\u00e7a na incerteza de que, tarde que seja, far\u00e1 daquela roupagem ut\u00f3pica a mais concreta realidade.<br \/>\nAssim se tece a vida das gentes. E de outro modo n\u00e3o parece ser vi\u00e1vel, tirante a conforma\u00e7\u00e3o dos desambicionados, gratos \u00e0 vida por sab\u00ea-la ar, fogo, terra, \u00e1gua. Por sab\u00ea-la dia, noite, sol, lua, ver\u00e3o, inverno, c\u00e9u, inferno.<br \/>\nPortanto, esperan\u00e7a n\u00e3o se perde, se retoca. Perd\u00ea-la \u00e9 perder-se. Perd\u00ea-la \u00e9 encontrar a descren\u00e7a. Perd\u00ea-la \u00e9 descrer dos homens s\u00e3os. Perd\u00ea-la \u00e9 descrer que a natureza, como Deus, \u00e9 amoral, n\u00e3o-idiossincr\u00e1sica. Perd\u00ea-la \u00e9 descrer de si mesmo.<br \/>\nN\u00e3o. A esperan\u00e7a revigora a raz\u00e3o como a paix\u00e3o. Pensar a vida, projet\u00e1-la e ter f\u00e9 em si, nos outros. Trope\u00e7os s\u00e3o os imponder\u00e1veis pr\u00f3prios aos que se p\u00f5em a caminho.<br \/>\nEnt\u00e3o as pequenas utopias perfilham como as conquistas a que levar\u00e3o os projetos tra\u00e7ados e vivos. Feitos, refeitos. E s\u00e3o infind\u00e1veis, permanentes. Reorganizados, se n\u00e3o atingidos. Tornados j\u00e1 outros, quando se toma o champanhe de um p\u00f3dio.<br \/>\nPois aquela utopia (quase boba, n\u00e3o a confessaria) fora sendo preterida por outras, que a urg\u00eancia da vida urde e se tornam incontorn\u00e1veis. Todo ano, precisamente, toda passagem de ano retocava-a. As pessoas em estado de gra\u00e7a, contaminadas pela epid\u00eamica e inconsciente alegria de que um ano novo vai se inaugurar. Logo, \u00e9 tempo de renovar esperan\u00e7as, reenergizar-se e pisar o ano entrante querendo ser, querendo poder.<br \/>\nD\u00e1-se a hora do r\u00e9veillon. Fogos pipocam a incendiar a incontida alegria global. Hora m\u00edstica, de soltar adrenalinas, afeita a magias. Efusivos, emocionados, cumprimentos, m\u00fatuas felicita\u00e7\u00f5es. As televis\u00f5es mostram o mundo todo feito de pirotecnias.<br \/>\nEnt\u00e3o as utopias s\u00e3o formuladas, renovadas, refeitas. E toca vestir-se de novo ano e na sua tessitura estar de verdade tecendo e torcendo por suas utopias. Das quais muitas s\u00e3o o cotidiano de muitos outros. Sim, tamb\u00e9m as utopias s\u00e3o muito relativas.<br \/>\nPois nesse Ano Novo sua utopia simples, singela (quase boba, n\u00e3o a confessaria) estava em vias de se plenificar. Fora mais cedo. Ela o surpreenderia. Quando chegasse pensando t\u00ea-la que esperar, a veria j\u00e1 devidamente acomodada naquele lugar, naquela mesa pensados. A vela de cera comprida e verde feito um cacto ocupando o centro da mesa. Na hora exata, ele a acenderia com seu isqueiro niquilado, heran\u00e7a de av\u00f4 pra pai, de pai pra filho. Depois do beijo demorado (l\u00e1bios nos l\u00e1bios), sem pejo dos outros, que, t\u00e3o euf\u00f3ricos, talvez nem os percebessem, brindariam com cerveja e \u00e1gua t\u00f4nica. Ele faria o pedido que ela j\u00e1 sabia: bisteca ao ponto a ser servida depois do espocar dos fogos e dos cumprimentos.<br \/>\nDepois se sentariam. Um de frente pro outro. Ele olhando nos olhos azuis dela. Ela olhando nos olhos acastanhados dele. Enquanto, trocando car\u00edcias, bebericariam cerveja ele, \u00e1gua t\u00f4nica ela.<br \/>\nSeria, por fim, neste r\u00e9vellion. Naquela cidade enorme de que ambos gostavam. Naquele restaurante acanhado, simples de que ele tanto gostava. Ela j\u00e1 havia se instalado. Iria surpreend\u00ea-lo. Embora entre emocionada e apreensiva, pois pouco faltava para a meia-noite.<\/span><\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":"<p>Utopia Data 30\/dez\/2004 \u00a0\u00a0\u00a0\u00a0\u00a0Deixarem-se ficar ali por conta da hora \u00e0-toa. Hora sem tempo marcado. Hora para puro prazer de estar se sentindo pleno de t\u00e3o vazio de tudo que n\u00e3o seja aquele absoluto instante. 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