Educutopia

Data 04/jul/2005

As teorias educacionais. Versáteis. Mutáveis.Vivas. A sua aplicabilidade embasada em seus princípios ideológicos. Nunca ele rechaçara peremptoriamente alguma. Tampouco tomara uma como a única. Com todas ensinara e aprendera. Aprende-se, ensinando. Ensina-se, aprendendo. A prática pedagógica exige tomada de decisão, posicionamento, medidas, procedimentos. Para os quais os múltiplos pressupostos teóricos saem em socorro. Sobremaneira, agora, quando a verdade em voga advoga que os educandos são cada um, aos quais se devem as suas devidas medidas.
Lia. Em reuniões, encontros, discutia, com certa veemência muita vez, postulados, fazia as suas postulações, ouvia outras. A educação era o seu cotidiano. Com a educação construíra sua vida. A de seus filhos. Também, cria, por meio dela, ajudou multidão de meninos e meninas, moços e moças a pensar o mundo, a construir estudos, caminhos que conduziam a leituras.
Por mais que não se queira; por mais que a isso se faça pouco; por menos que nisso se acredite; a escola, antiqüíssimo lugar de ações que se pretendem sobre o ensino-aprendizagem, continua um laboratório de vivências. Sua história inscreve-se de superestimações, de conservadorismos, de mesmices, de transformações, de vilipêndios, de morte anunciada, de elitismo, de superficialidades, de autoritarismos, de liberalismos, de grandezas, de pequenezes, de súbitas surpresas.
Raul Pompéia, em seu Ateneu, uma obra literária primorosa, que escolas de hoje não suportam estudar, representa alguns desses aspectos. E o faz sob um verismo irrefutável, hoje ainda mais: a escola é um microcosmo. Nela, a vida, sócio-econômico-cultural está representada. É certo que o ateneu que o Ateneu de Pompéia figurou era o de uma das poucas escolas e aristarcocráticas da época. Cujos resquícios sobreviveram às expensas dos contemporâneos requintes e continuam a serviço de privilégios para privilegiar.
O ateneu em que ele vivera construindo a sua vida e vidas (não obstante a presunção que talvez daí se infira) fora o de escola pública oficial. Escola cujos primórdios, como sobejamente registra a história, também era de poucos. Muitos poucos.
A expressão estereotipada e ainda corrente é a de que nela estudavam os filhos dos que podiam. Os filhos dos que não podiam freqüentavam toda ordem de trabalho. Estudo era coisa de rico. Certo: com a abertura do período noturno, começavam as escolas a enveredarem-se pela via da democratização. Assim sendo até abeirar-se à condição de escola popular como a de hoje. E sua popularização atingiu tanto o banco (a carteira) quanto a cátedra (o magistério).
Sua formação se fizera no seio dessa escola que viera se popularizando. Estudante de curso noturno desde o denominado ginásio. Curso universitário noturno. Ingresso no magistério público oficial. Vivera, pois, essa evolução. Ora inconscientemente. Ora com mais clareza e consciência do processo. Era, então, um espécime da escola popularizada, na qual fora carteira e depois se tornara cátedra.
E nesse percurso muita teoria pedagógica passou sob o céu (e o inferno) e no seio desses logradouros de ensino estatal. Passara tanto pela carteira quanto pela cátedra ouvindo, vendo, discutindo, dizendo e de certo modo, até a um certo ponto, combatendo um outro verismo irrefutável: a escola da elite e a escola dos pobres. Estigma que a democracia haveria de corrigir. Aspirava-se à escola única. Onde coubessem ricos e pobres. E que esses metais fossem amalgamados por uma educação que disso fizesse resultar uma mais fina e sã realidade. Em vão. Parece que não dão liga. A estampa mais rica logo se confina. Restou uma escola pública única, majoritariamente, aos pobres. Então a nova utopia: uma escola aos pobres (que verdadeiramente não a possuíam), mas que não se permitisse ser uma escola pobre.
Para isso podem pouco as mais variadas teorias educacionais e pedagógicas. E muito pouco ainda é, se a elas se agregar puramente uma vontade política desacompanhada de vontade econômico-financeira sólida e determinada.
Enquanto não: sem escola pública única, onde conviveriam ricos e pobres; mas escola de pobres em tudo ainda muito empobrecida.